Se houvesse intimidade o
bastante, haveria, também, perguntas do porquê da cara de ciúme,
do porquê da cara de decepção, do porquê desse humor tão
instável, do porquê de tanta necessidade. Se houvesse intimidade
haveria a tentativa de entendimento. Haveria conversas sobre o pôr
do sol, poesia, lendas e fotos. Haveria a curiosidade a cerca de tudo
e haveria muita coisa em comum.
Se houvesse intimidade haveria
troca de SMSs, ligações de madrugadas e não faltariam convites pra
jantar, caminhar, dançar ou beber vodka. Se houvesse intimidade
seria permitido apego, haveria conhecimento do desejo e as
mãos se encaixariam.
Se houvesse intimidade não
haveria pressão, nem obrigações. Sem status no Facebook haveria
relacionamento, mesmo que um assim bem de mentirinha, mas cheio de
sinceridades sem mentiras sobre exclusividade e quando estivéssemos
juntos seríamos corpo e alma um do outro, como se não houvesse mais
ninguém. Se houvesse intimidade e apego e um relacionamento de
mentirinha haveria, também, ligações pra aparecer do nada, mas só
se você também aparecesse quando eu tivesse vontade de você
durante a madrugada fria.
Se houvessem intimidades
certamente seria diferente, mas foi acidente de percurso, impulso do
momento, culpa toda do ambiente que era propício. E, na realidade,
de você não sei nem o nome completo, o único sms mandando não foi
respondido e a ligação do dia seguinte não aconteceu por falta de
intimidade.
Não há intimidade, mas se
houvesse seria diferente. Seria divertido e seria bom de ter perto,
mas não há intimidade, não há relacionamento, não há ligações
de boa noite. O que existe é só o olhar que contra a ordem me olha
e diz tudo que não foi dito e confessa e pede enquanto meus olhos
brincam: horas correspondem, horas te olham, horas te esnobam.
Daqui é tudo muito divertido:
um jogo perigoso que não será jogado. Queda de braço pra ver quem
cede primeiro, disputa infantil sobre não ligar, não convidar e se
não houvesse o olhar que me chupa como um zoom, que muitas vezes me
faz perder a pose e sorrir feliz e outras tantas vezes me faz te
olhar de voltar só pra te tentar, se não houvesse o olhar não
haveria esse texto. Mas se houvesse intimidade, não haveria jogo por
ser perigoso demais.
Se houvesse intimidade e apego
seria diferente, haveriam textos, declarações e confusões. Seria
necessário abstrações. Mas não há intimidade. Não há apego e,
o mais importante, não há informações. Só existe o jeito de
olhar, o jeito de falar e aquelas malditas mãos quentes junto com
aquele perfume insuportável e o toque que em voltas volta a minha
cabeça, então existe jogo! E uma enorme curiosidade de saber até
onde vai, até onde é divertido, mas as regras são claras, por não
haver intimidade, não pode haver conversas, não pode permitir
apego.
Por não haver intimidades
existe segurança e permissão a continuar com esse jogo que não
existe. Imaginando esses olhares cheios de significado, sonhado em
poder sentir mais uma vez o toque e fazendo de tudo pra jamais
acontecer. Por não haver informações pode se imaginar que existe o
jogo, imaginar como seria se houvesse intimidade.
E, por fim, agradecer por não
haver intimidade, por não haver apego, por não haver ligações,
por não haver possibilidade de cativação. Por não haver
intimidade pode-se ficar e escrever e falar que se houvesse
intimidade haveria sensação de bem estar, teria a certeza que ali é
o lugar certo e ali seria o lugar que mais se deseja estar por haver
devoluções, mas se houvessem intimidades haveria fuga e seria
oficialmente complicado.
Só para manter a tradição ...
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